Organizado pela ANAM – Associação Nacional de Assembleias Municipais, decorreu no dia 22 de março na Assembleia da República (Centro de Acolhimento ao Cidadão) o seminário “2021 – Um novo paradigma para o poder local”.
Fotografias do Evento
A Assembleia da República serviu de palco para o seminário/encontro “2021- um novo paradigma do poder local” que reuniu a 22 de março vários oradores: Albino Almeida, presidente da ANAM, Jorge Lacão, vice-presidente da Assembleia da República (AR), Pedro Soares, presidente da Comissão Parlamentar de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, Luís Almeida, Investigador do Institute of Public Policy e António Costa Silva, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD.
As intervenções iniciais geraram de imediato um consenso em redor da constatação de que a Assembleia Municipal é um órgão maltratado e a que não tem sido dada a atenção necessária.
Jorge Lacão, que desde há mais de 20 anos é um acérrimo defensor de uma alteração no edifício legislativo do Poder Local fez uma intervenção de enorme importância percorrendo o caminho histórico do início da democracia – em que era necessário gerar consensos permanentes em comunidades que tinham estado muitas dezenas de anos sem discutir e sem comandarem o seu destino – passando pela revisão constitucional de 1997 (em que Lacão chegou a ser Presidente da Comissão de Revisão Constitucional) que introduziu alterações que dão conforto na Lei Magna a que, por exemplo, se corrija a situação em que, através da representação e do voto dos Presidentes de Junta se consiga desvirtuar a representatividade democrática das Assembleias Municipais.
Neste ponto, o vice-presidente da AR sugeriu que qualquer alteração deveria ser efetuada sempre com a intervenção da ANAFRE sendo certo que a ANAM tem já no seu calendário a necessidade de estreitar o relacionamento com esta associação representativa das freguesias.
No decorrer da sua exposição, o deputado Jorge Lacão abordou a questão das várias alternativas e da necessidade de, na próxima legislatura, algo ser efetivamente alterado, tanto mais que o presente momento de descentralização trará, não obstante algum esquecimento e subalternização das AM’s nesse processo, uma maior necessidade ainda de fiscalização.
Foi ainda ressaltado pelo mesmo dois pontos que espelham bem a subversão do sistema atual que , no limite dos limites, prejudica fortemente a alternância: ao manter os opositores na gestão corrente e em caso de apoio a algumas medidas faz com que o “opositor” passe a “colaboracionista” e internamente, no seu partido ou movimento de origem possa vir a ser excluído. Ao impedir que o vereador da oposição possa intervir na Assembleia Municipal “seca-o” politicamente e impede-o de voltar a ser candidato. Ou seja, o sistema atual impede a construção de soluções de alternância.
O também Vice-Presidente da Assembleia da República e Deputado do PS elencou as alternativas legislativas e mereceu um unânime aplauso.
No seminário da ANAM, marcou também presença o Presidente da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, deputado Pedro Soares. Este, que desde sempre foi um apoio forte da ANAM, e que teve como um dos seus primeiros atos a audição na 11ª. Comissão, destacou a, tantas vezes esquecida, autónoma legitimidade democrática do órgão Assembleia Municipal.
Na verdade, é preciso ter presente que a Assembleia Municipal é eleita separadamente da Câmara Municipal o que leva de resto, a que os resultados possam ser diferenciados.
Ora, esse poder que deriva dessa legitimidade democrática própria não é consequente e as Assembleias Municipais são vistas e tratadas como um parente pobre do Poder Local, com um estatuto menorizado e que a falta de meios e de orçamento próprio acentua.
Pedro Soares vincou de resto esta necessidade de dotar de meios próprios e de capacitação das AM’s como o caminho necessário, mais uma vez sublinhando o momento de transferências de competências, para que as mesmas possam desempenhar na plenitude o seu papel principal: o de fiscalizar o executivo. Deixou uma última palavra de permanente disponibilidade da Comissão, de alento e de reconhecimento pelo papel da ANAM.
Albino Almeida, Presidente da ANAM, relembrou o caminho difícil e cheio de obstáculos que a Associação tem vindo a percorrer, sublinhando enfaticamente que “a ANAM veio para juntar e não para dividir, que veio para construir, para fazer o que não está feito e para dar resposta a uma necessidade sentida pelos Presidentes das Assembleias Municipais e não para fazer o que já está feito”. Resumiu nas suas palavras, a vontade de o percurso ser feito sem estrondo, sem protagonismos mas com “trabalho sério, coerente, estruturado”.
Neste sentido, é aqui que radica a permanente coesão dos PAM’s ao verificarem esse percurso. A ANAM celebrou um protocolo com o IPP de onde resultará um Livro Verde para o poder local e ainda, este primeiro semestre, um regimento tipo em que ressaltará o estatuto de oposição.
As propostas da ANAM têm sido, assim, no sentido de não aumentar a despesa mas de aumentar a eficiência. Albino Almeida (que ironizou o sobrenatural que é atribuído aos membros da AM que têm de ver orçamentos de milhões em 48 horas) sugeriu a criação de uma figura próxima da UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) municipal que poderia ser, despretenciosamente, assumida por um ROC do município.
O deputado António Costa e Silva, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD, abordou a temática do processo das Assembleias Municipais no processo de descentralização.
Salientando a importância das matérias relacionadas com a descentralização de competências do Estado Central para entidades mais próximas dos cidadãos, destacou ainda a discussão no âmbito da dicotomia interior litoral/territórios de baixa densidade e todas as matérias relacionadas com a coesão territorial.
“Os portugueses têm expectativas positivas acerca do processo de descentralização de competências do Estado Central para as autarquias. Têm grandes expectativas na melhoria nos serviços públicos. Numa maior proximidade entre o Estado e os cidadãos. Grande parte dos autarcas do nosso país também tem grandes expectativas neste processo. E não se podem defraudar essas expectativas positivas”, acentuou.
Durante o seu discurso, abordou a questão do acordo celebrado entre o Governo e o PSD (Transferência de competências para as autarquias locais) e que pressupõe, ainda durante a legislatura vigente, a aprovação da referida reforma, composta formal e politicamente pela Lei-Quadro, complementada pelos Decretos-Lei Setoriais, pela revisão da Lei das Finanças Locais e pelos “envelopes” financeiros associados a cada Autarquia local com identificação das verbas por área de competências.
Segundo o deputado, dois dos 4 elementos essenciais do Acordo entre Governo e PSD (Lei-Quadro da Descentralização e Revisão da Lei das Finanças Locais) foram decididos em simultâneo no mês de julho do ano passado, ou seja, dentro dos prazos acordados. No entanto, explica que “nas matérias que eram da responsabilidade do Governo (e da sua negociação com a ANMP e ANAFRE) já não foi bem assim. Os prazos foram sistematicamente falhados.” Apesar disso, salientou que todos os decretos regulamentares (setoriais) já se encontram acordados com a ANMP: “É fundamental que o Governo conclua com urgência a negociação dos envelopes financeiros associados a todo este processo de descentralização. E esta é uma matéria decisiva.”
O vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD, declarou que “em todo este processo, as Assembleias Municipais e os seus eleitos vão ter um papel ainda mais determinante. Os mais de 20 diplomas setoriais vão aumentar o nível de exigência das Assembleias Municipais, o que significa que os deputados municipais vão ter que estar ainda melhor preparados para estudar, analisar, fiscalizar e propor, no âmbito daquilo que são as novas exigências, funções e competências municipais.” Sublinhou ainda que tudo isto significa “que é obrigatório ter um novo olhar para as Assembleias Municipais, ajudá-las a adaptar a esta grande mudança, preparando os seus membros para a nova realidade. Facultar-lhes os meios necessários para a realização do seu trabalho de uma forma eficaz e eficiente também é decisivo.”
António Costa e Silva, terminou sublinhando que “o PSD vai continuar empenhadíssimo neste processo de descentralização de competências do Estado Central para as autarquias. Esta é uma missão demasiado importante. Não pode ser perdida esta oportunidade.”
O evento terminou com diversas intervenções no debate por parte de alguns dos Presidentes de Assembleias presentes, nomeadamente de Manteigas, Santa Comba Dão, Meda, Ferreira do Alentejo, Lagoa, Portimão e Monchique. Participações que se revelaram numa interessante troca de experiências e ideias entre todos.